quarta-feira, 16 de março de 2011

Matéria sobre a Lua Nova publicada no site Texto Vivo

O site Texto Vivo: Narrativas da vida real publicou recentemente uma matéria sobre a ONG Lua Nova. Confira a matéria aqui no blog ou acesse-a diretamente no site Texto Vivo.

A Lua à luz do dia


Fernanda Bonadia *

Larissa levantou da cadeira na minha frente e entrou na casa. Nós estávamos nos fundos, pois ela não queria que ninguém mais ouvisse suas confissões. Voltou. Parou em pé ao meu lado e acendeu um cigarro Eight. “Põe Marlboro, pelo menos”, ela me diz, soltando a primeira fumaça. “Esse cigarro é um real e oitenta centavos, põe um de cinco reais aí no teu texto. Marlboro Light!”
Vaidosa e certa dos seus objetivos, ela afirma mais de uma vez que é uma pessoa que corre atrás do que quer. Natural da capital paulista, essa menina de 17 anos saiu de uma favela no bairro do Tatuapé para morar com o filho no Residencial da ONG Lua Nova, no interior de São Paulo.

- Quantos filhos você tem?”, pergunto.
- Dois. Não me pergunte do outro, por favor”, pede.

Larissa mora desde maio de 2009 em Araçoiaba da Serra com Mateus, 2 anos.

“A maioria vem de uma realidade embaçada, e eu acho que aqui é um bom lugar pra elas construírem uma nova vida, porque lá fora ninguém dá oportunidade, e a Lua Nova dá”, acredita a garota. “Quem tá aqui dentro, tá trabalhando, fazendo as coisas, levando uma vida de gente.”

- Você acha que antes não levava uma vida de gente?
- Porque não queria. Eu já conheci o outro lado da vida, de drogas, arma, dinheiro, homem – ela ri ao fim da frase. – Nada de filho. Não tinha nada a ver com filho minha vida lá fora. Em parte meu filho tem a ver com a minha mudança. É por ele que eu tô aqui.

Larissa conta que sua família era “chapa quente” e que viu o fim de vários deles. Nesse meio, ela já usou todo tipo de droga, menos as injetáveis. “Vou falar pra você que eu sinto muita falta. Ôrra! Muita falta eu sinto das coisas erradas que eu fazia. Sinto falta. Claro que eu sinto. Era uma coisa de mim. Eu parei assim de repente, faz falta, né?”

Para conseguir os entorpecentes, ela traficou e morou com o pai do filho, porque ele oferecia tudo pra ela. “Dois anos pra mim engravidar dele. Quase não me deitava numa cama com esse homem. Não tinha desejo por ele. Optei por ficar com ele pra ter o que eu queria. Coitado! É um coitado ele.”

Ela acredita que seu caminho era sem volta, mas que Deus entrou em sua vida – o nome do seu filho, Mateus, é de origem hebraica e significa justamente “dádiva de Deus”. Então pergunto como foi a mudança para largar as drogas: “Eu já perdi um filho, né? Não queria perder o outro. Sempre pra falar dele tenho que contar tudo pra pessoa entender, então, eu prefiro não falar”.

- E os dois filhos são do mesmo pai?
- Não. De gente como eu, nunca é!

Larissa conta, sem hesitar, que seu maior objetivo é o filho. “Não é só isso, não. Eu sei como funciona lá fora. Na quero continuar daquele jeito, entendeu? Sabendo como funciona, acho que se eu voltar de novo pra vida lôca, já era. Vai ser pra morrer no crime.”

Ela tenta focar no pequeno Mateus: “Quero dar pra ele tudo que ele desejar ter. Eu sei que vou conseguir, porque eu sou a mina. Eu sou a mina!”.

Gestação tripla

Em junho de 2010, o governo italiano apresentou ao Parlamento o Relatório Anual a respeito do uso de entorpecentes e sobre o estado dos usuários. Segundo os dados, em 2009, houve uma queda de 25,7% no número de consumidores, em relação ao ano anterior. Enquanto em 2008 havia 3,93 milhões, no ano seguinte o montante alcançou 2,92 milhões de pessoas.

O uso de drogas na Itália é muito delicado e são necessárias diversas ações para atender aos usuários. Para complicar, lá o principal uso é o de heroína – derivada do ópio –, que possui vicia bem rapidamente. Por isso, há diversas Cooperativas de Trabalho destinadas aos usuários de drogas, onde se trabalha desde o tratamento até a articulação de rede, junto com postos de saúde, por exemplo.

Foi trabalhando em um lugar desse por sete anos que a psicóloga Raquel de Barros, 44, adquiriu experiência com o tratamento da vulnerabilidade. Ela foi se especializando como educadora de rua, área de redução de danos, trabalhou com problemas sociais sérios como AIDS e prostituição e ainda fez um curso de acompanhamento mãe-bebê.

Ela permaneceu na Itália entre 1992 e 1999, sendo que nos últimos quatro anos esteve casada e tentando engravidar. “Como eu tinha essa história de não conseguir engravidar e eu queria vivenciar a maternidade de algum jeito, falei ‘é melhor eu trabalhar com aquelas que têm filho e não conseguem ser mãe, do que com uma mais elitizada’. Aí eu resolvi abrir a Lua Nova”, lembra Raquel.

A fundação da ONG veio acompanhada da tão sonhada gestação: Raquel descobriu que estava grávida e deu à luz as gêmeas Giulia e Sofia. “É muito lindo [ser mãe]. Por isso eu acho que naquele momento me deu muito mais força. Quando tá na barriga é uma coisa, mas quando você vê que tem uma pessoa, é uma coisa mágica. Então, você fica imaginando como é possível qualquer pessoa no mundo, que vê aquilo e sente aquela sensação, não goste e despreze aquilo. É impossível. Quer dizer, ela pode desprezar cinco minutos depois, porque ela se liga na realidade.”

Nos primeiros anos da Lua Nova, Raquel teve que repensar a metodologia utilizada na Europa, pois o contexto era totalmente diferente. “Aqui, o problema não é a droga. É a falta de dinheiro, falta de estrutura, falta de tudo. Até a questão do abuso e exploração sexual vêm antes. A droga aqui é um sintoma.”

Entre algumas das profundas diferenças está a ausência de uma família. “Não tinha como fazer o resgate familiar porque a família era o próprio problema”, explica, “então, a gente tinha que pensar nelas como família. E a ideia da Lua Nova é exatamente essa: uma vez que tudo é tão ruim, vamos buscar as coisas positivas. Lidar com a maternidade como uma coisa positiva”.

Porém, ter um filho é um problema grandioso para essas jovens, e mudar essa visão não é uma tarefa fácil. Raquel pondera: “Não que elas não gostem da criança, mas é um jeito diferente de gostar, porque se você acaba gostando, você também acaba tendo que levar em conta todo contexto, que não é uma coisa muito simples. É difícil ser mãe pelo fato de que é difícil viver daquele jeito; difícil comer, difícil beber, difícil arrumar emprego”.

Larissa, por exemplo, se recorda que foi “normal” descobrir que estava grávida. “Eu já tive um, e do meu primeiro eu nem fiquei surpresa. Eu não achei graça, nem bonito, nem legal, nem ruim. Não achei péssimo, mas também não achei bom. Eu não achei nem bom, nem mau, sabe assim? Não me afetou em nada, continuei sendo a mesma pessoa, comendo as mesmas coisas, dormindo de barriga pra baixo e chupando o dedo.”

Suas duas gestações foram de meninos. “Eu sempre falei, se eu tivesse uma filha mulher, eu não ia querer, porque acho que mulher é muito sem vergonha. Dá muito trabalho. Eu fui um demônio, imagina minha filha como seria! Porque os filhos fazem o que os pais fazem. Eu não ia querer uma filha que nem eu sou, não. Já largava ela na rua”, afirma a garota. Porém, em seguida ela, confusa, se corrige: “É mentira, sabe por quê? Depois que a gente tem um filho, a nossa ideia muda. Por enquanto acho que eu não ficaria não. Mas é que coração de mãe é foda”.

A principal ferramenta para conseguir fazer com que os laços maternais se estabeleçam na Lua Nova é o uso da criatividade. “Aquele filho tem vários significados, e você tem que ajudar ela a entender qual é o significado e como se relacionar com ele. Tem muito filho de abuso, tem muito filho de abuso de família, filho de prostituição”, observa Raquel. “Não dá pra você chegar e falar ‘agora você tá aqui com seu filho, fique feliz’. Por isso tem que buscar esse equilíbrio com cada menina. Cada uma tem seu tempo.”

Sobre qual é o perfil das meninas que entram na Lua Nova, Raquel explica que tem de tudo um pouco. “Tem a menina que mora na rua, a menina que sofreu exploração sexual, a menina que a mãe tinha um bordel e fazia ela se prostituir pra pagar traficante, tem a menina usuária de droga, tem tudo junto, tem tudo separado. Tem aquela, por exemplo, que viveu sempre em abrigo e quando engravidou não pode ficar naquele abrigo, então tem que vir pra cá, e a grande característica é a dor pela falta. O que mais tem é a falta, a dor, aquele vazio. Mas, ao mesmo tempo, são pessoas que têm um potencial enorme”, ressalta.

No meio do caminho havia uma pedra,
havia uma pedra no meio do caminho

O portão de ferro estava apenas com uma fresta aberta. Entrei a pé e avistei a placa indicando que ali era o Condomínio Social. Naquela tarde de sábado, o parquinho das crianças estava vazio e a rua principal do lugar não tinha nenhum morador. Continuei meus passos pela via de terra com pedregulhos. Todas as seis casinhas geminadas, totalizando doze, ficam do lado direito da rua. À esquerda, um matagal de estatura mediana. Cheguei na segunda casa e consegui avistar uma moradora: “A Pamela está aí?”. Ela saiu e me indicou qual era a moradia certa.

Ao alcançar a porta, encontrei a garota cuidando das duas filhas da vizinha. Ketlyn, sua mais velha, já havia tomado banho; Nicole, a neném de 1 ano e 9 meses, de Sandra, estava sendo trocada pela moça; enquanto que Amanda, 7, também filha de Sandra, era chamada para sua vez de se lavar. “Eu acho que sou uma boa mãe. Às vezes, eu queria ser melhor em algumas coisas. Eu não tenho pulso firme, e acho que mãe teria que ter pulso firme. Falar não, é não”, revela Pamela Olimpio dos Santos, 22, mãe de Ketlyn, 8, e de Matheus, 5.

Pamela engravidou da filha em 2001, após sofrer abuso sexual no Guarujá. Residente de abrigos durante toda a vida, às vezes ela fugia e passava dias pelas ruas da cidade praiana ou em casas de amigos do abrigo. Foi durante a pernoite na casa da colega Cícera que um rapaz armado e da favela a estuprou. “Naquela época eu não aceitava minha filha como sendo minha. Eu a amava como uma irmã”, recorda.

Quando descobriu que estava grávida, Pamela mudou-se para o Rancho do Senhor, um abrigo situado na capital paulista, há 82 quilômetros do Guarujá. Com a filha nos braços, ela conheceu a Lua Nova, sua única possibilidade de permanecer com a criança, já que os demais locais não aceitariam ambas por conta da diferença de idade. Assim, ela andou por mais 123 quilômetros, e instalou-se no Residencial da ONG, e lá permaneceu durante um ano.

A garota foi reinserida na sociedade pela primeira vez em 2003. Como se sentia muito sozinha, voltou para o Guarujá. “No abrigo, eles tiraram a Ketlyn de mim, aí nós ficamos dez meses separadas. Eu entrei em depressão, tentei me matar [tomando duas cartelas do calmante Diazepan[. Foi nesse tempo que eu dei o valor real pra minha filha. Foi um sofrimento que nunca mais quero passar na minha vida.”

Para ter a filha de novo, Pamela teve que voltar para a Lua Nova, pois só lá ela encontraria estabilidade para criar a pequena. Ela retornou ao residencial em agosto de 2004, com Ketlyn nos braços e grávida de 8 meses de Matheus, fruto de um namorico com um rapaz do abrigo. “Um dia eu tentei me matar. Hoje tenho medo de morrer e deixar meus filhos”, conta.

Viagem para a Lua

“Um pequeno passo para o homem, um grande salto para a humanidade”, disse o americano Neil Armstrong ao descer da Apollo 11 e ser o primeiro homem a pisar em solo lunar. Na época, há 41 anos, a corrida espacial foi tensa e envolveu investimentos pesados até os Estados Unidos alcançarem esse feito. Milhões de terrestres acompanharam pela televisão essa que é uma das maiores realizações humanas.

Essa viagem, recheada de perigos e emoções, não se compara com a tremenda aventura que envolve a entrada das meninas nesta Lua localizada em Araçoiaba. Decidir mudar de vida não é fácil, mas é necessário para que elas permaneçam neste novo solo lunar. De acordo com a fundadora Raquel, “a ideia é acolher, atender e mostrar pra elas as oportunidades, mas eu acho que a pessoa tem o direito de escolher o que ela quer”.

Primeiro, é realizada uma triagem de toda a demanda que chega. Uma entrevista é feita com cada jovem, em que ela conta sua história, complementada pelas informações fornecidas pelo conselho tutelar ou à justiça. Além disso, são explicadas as regras da casa, pois toda a estrutura do local é mantida pelas próprias moradoras.

“Cada uma lava sua roupa. Cada uma tem uma parte de limpeza na casa que é feita em rodízio. Tem a parte de alimentação, em que a cada semana duas meninas ficam responsáveis pela cozinha”, relata o psicólogo Fábio Martins, 35, único homem no residencial. Por isso a menina tem que querer mudar, pois as normas são muito rígidas e elas precisam assumir suas responsabilidades.

“Eu acordo 5h30 pra me organizar, tomar meu banho, arrumar meu quarto e arrumar meu filho. Dou café da manhã e escovo os dentes dele. Eu não dou banho de manhã cedo nele, porque é muito frio. Troco a roupinha dele, a fralda dele. Deixo ele prontinho e mando ele pra Casa das Crianças. Aí vou embora”, descreve Larissa.

Pamela, por sua vez, confessa: “Eu não gostava de ficar muito presa, e não poder sair em alguns momentos. Tinham algumas regras que eram muito rígidas, tipo fumar sete cigarros por dia. É uma coisa até pra zelar pela nossa saúde, mas é difícil uma pessoa que vem acostumada num ritmo, chegar lá e ter que mudar duma hora pra outra”.

Porém, pondera sua posição ao afirmar que foi importante aprender a se relacionar com os filhos. “Antes, eu dava banho na minha filha, trocava, largava ela no chão e pronto. Mas não é isso. E o carinho? O amor? E a atenção? E a conversa? A Lua Nova me ajudou em tudo isso.”

Pau que nasce torto não morre torto

A casa onde Pamela vive hoje com os dois filhos terminará de ser paga em breve. Assim que se atravessa a porta principal há uma saleta. Ao lado direito da porta fica a janela em cima da pia, e ao seu lado, um caixote vermelho cheio de sapatos e Florzinha, uma cachorra filhote, dormindo. Na parede à direita, a geladeira e, na da esquerda, um armário de duas portas. No centro, uma mesinha com quatro cadeiras. E na parede à frente, um quadrinho muito pequeno, de formas geométricas, cujas cores muito vivas lembravam as obras do artista brasileiro Romero Britto. A partir dessa parede, à esquerda tem o quarto com uma cama e a bagunça, e à direita outro quarto onde Pamela dorme com os dois filhos, ao lado do banheiro.

Todas as casas do condomínio social foram construídas pelas próprias meninas que trabalham na Empreiteira Escola, um dos projetos de geração de renda da Lua Nova. Nela as meninas produzem tijolos e aprendem atividades da construção civil. “É muito gratificante saber que foi você mesmo, com seu suor que construiu tijolo por tijolo. O sonho da casa própria, sabendo que não foi dado de mão beijada, que você lutou, que você realmente mereceu ter, é muito gratificante”, diz Pamela sorrindo com os olhos.

A primeira palavra que me vem à cabeça quando observo Pamela é força. Assim como as outras jovens da Lua Nova, ela detém um poder incomensurável, e a maternidade foi essencial para esse processo que ainda tem muitos obstáculos a serem superados:

“Às vezes eu quero largar tudo e sair correndo. A gente sofre muito preconceito. Aqui, as pessoas veem a gente como as drogadas e prostitutas, rotulam a gente pelo passado. Eu, como cidadã, tenho direito de ficar num lugar no final de semana e beber minha cerveja. Porque eu bebendo cerveja é diferente do que você bebendo cerveja? Eu acho que isso não é certo, pois se eu vim pra cá foi pra fazer a história dos meus filhos diferente, não pra ser rotulada”.

Não bastasse o preconceito dos vizinhos, Pamela ainda precisa lidar com tudo que envolve sua opção sexual. “Eu fico com mulher e aí é difícil explicar pros filhos. Meu filho mais novo é pior: ‘Mãe, se você é mulher, porque tem cabelo curto?’ A minha mais velha já entende um pouco. Uma vez fui na escola dela, e uma amiguinha falava assim ‘Ketlyn, seu pai chegou’, aí ela falava ‘não é meu pai, é minha mãe’. Aí a menininha ‘não, é seu pai, parece um homem’. Ela chegou em casa e contou pra mim: ‘Sabe, mãe, mas eu nem ligo, o importante é que eu amo você’. Lógico que eu chorei. Parecia um bebê”, conta a garota, com os olhos baixos e um sorriso tímido nos lábios.

840 luas novas e dez velinhas

“O grande atrativo da Lua Nova não é o acolhimento, mas a geração de renda”, explica Raquel Bastos. Ela se refere aos negócios onde as meninas trabalham e conseguem tirar o próprio sustento. Além da Empreiteira Escola, ainda tem o Criando Arte, em que as jovens produzem bonecas de pano, bolsas e capa para almofada; Brindes da Lua, onde são produzidos marcadores de livro, chaveiros e lembrancinhas para aniversário, por exemplo; e Padaria Lua Crescente, em que as meninas cozinham e servem coffee-break em eventos.

Outro diferencial da Lua Nova, e que mostra a originalidade do trabalho, é o fato de verem as meninas como parceiras, não como assistidas ou residentes. “Não é eu que vou te ajudar, nós vamos fazer juntas”, explica Raquel. “Eu comecei a ver que não tinha recurso nenhum, e ou eu inventava alguma coisa que elas também participassem, ou então ia ficar complicado.”

E é exatamente por ver as garotas como parceiras, que a idealizadora da Lua Nova busca nas jovens o que elas têm e não o que está faltando. “Se a gente ficar muito no que falta, o que falta é só você suprir e tapar o buraco. Mas o que muda é o que tem.”

No ano passado, a ONG completou dez anos de existência. Até então, segundo Raquel, “essas pessoas ficavam no bolo dos usuários de drogas ou dos abrigos, sem ter uma atenção específica”. Vivendo como a Lua Nova que surge nos céus noturnos, estas meninas da esfera sombria do nosso mundo são ignoradas, mas de alguma forma, certo como o satélite que nos cerca, sabemos que estão ali. Para Raquel, uma grande conquista foi extamente dar visibilidade para essa população, que passou a receber, em âmbito nacional, uma atenção especial.

“Sempre falo: na hora que você olhar pra uma menina que ta na rua e tem um filho, não olhe pra ela com cara de dó, olhe pra ela pensando que ela tem um potencial”, incita a idealizadora da Lua Nova.

Apesar dessas conquistas nesses dez anos, a ONG ainda carrega diversos problemas a serem driblados. “A maior dificuldade acho que não é nem o preconceito, mas o conceito de sucesso das pessoas é de filme americano: a menina toda arrumadinha, a criança toda com a roupinha bonitinha, sapatinho, lacinho na cabeça, sem escorrer o nariz e tal. Essa coisa meio de final feliz, que nem na nossa vida tem. Então, achar que uma ONG tem que fazer isso, ou mesmo que ela quer isso, é muita pretensão. Acho que essa é a maior dificuldade. O que é o sucesso? Depende de cada pessoa.”


* Formada em jornalismo e história: pós-graduanda em Jornalismo Literário pela Academia Brasileira e Jornalismo Literário (www.abjl.org.br), turma São Paulo 2010.
Publicado originalmente no TextoVivo Narrativas da Vida Real; reproduzido com autorização.

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